Nota técnica: Pasteurelose em coelhos

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kassyPor: Kassy Gomes da Silva – Médica Veterinária, Doutoranda em Saúde, Tecnologia e Produção Animal Integrada PUCPR

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A pasteurelose é uma das doenças bacterianas mais comuns em coelhos, sendo causada pela bactéria Pasteurella multocida, com a existência de diversas cepas. É uma doença oportunista que pode aparecer quando não adotadas algumas medidas de controle. Possui grande importância econômica, por ser causa de grande parte do descarte de matrizes nas granjas e ser uma doença com um complexo sistema de controle, além de um tratamento lento, com alto custo e frequentemente pouco eficiente. Um surto da doença dependerá de diversos fatores ambientais e fisiológicos, às vezes com combinação de várias causas.

A via nasal é a principal rota de infecção, podendo também ocorrer pelas vias conjuntival, oral, transcutânea ou vaginal. Objetos e equipamentos contaminados com as secreções ou o pus são formas de contágio indireto. Coelhos com a doença na forma crônica representam o principal meio de infecção. Reprodutores e matrizes são constantes reservatórios dentro da granja. Matrizes podem transmitir a doença para os filhotes; a cópula também é um meio de transmissão entre os reprodutores do plantel. Material de inseminação artificial pode ser uma importante via de transmissão, com o nível de higienização do material e a experiência do operador sendo muito importantes na prevenção dessa forma de transmissão. Estima-se que 30-60% das falhas na inseminação ocorrem por causa de vaginite e/ou metrite causada pela inseminação, sendo a Pasteurella frequentemente encontrada nesses casos.

Secreções nasais/mamárias e conteúdo do abcesso representam a fonte primária para a transmissão por contato direto. Transmissão pelo ar pode ocorrer, principalmente em locais cujo ar tem muita poeira. Após a exposição à bactéria, o coelho pode ser resistente à infecção e combater totalmente a bactéria, tornar-se um portador assintomático ou desenvolver a doença aguda ou crônica. Estima-se que entre 40 e 72% dos coelhos clinicamente normais são portadores, podendo ou não apresentar a doença no futuro.

Com exceção de algumas cepas específicas, a bactéria é um patógeno facultativo, ou seja, ela se aproveita da diminuição da imunidade do coelho para causar a doença. Fatores externos contribuem para o aparecimento de um surto. Baixa umidade relativa ou ventilação excessiva aumentam a sensibilidade do epitélio nasal à infecção, assim como um nível alto de amônia, ração “poeirenta”, superlotação e falta de higiene de gaiolas, bebedouros e ninhos. Reprodutores alojados em sistemas de baterias podem ser mais propícios a desenvolver a doença. O chão da gaiola sujo prolonga uma endemia de mastite; a realização da palpação abdominal para diagnóstico de gestação em diversas fêmeas em sequência pode espalhar a doença, cujo risco é maior quando estas estão em lactação. Uma simples mudança de ambiente (troca de galpão, mudança brusca de temperatura, etc.) pode contribuir para o aparecimento de um surto.

Os sinais clínicos da pasteurelose variam de acordo com a forma adquirida da doença. A forma respiratória é a mais descrita, pela sua fácil visualização no plantel. Os primeiros sinais são localizados no trato respiratório superior, como rinite e traqueíte, com a presença de secreção nasal serosa/purulenta nos pelos do focinho e das patas da frente (Figura 1), além de espirros. Pneumonia, febre, dificuldade em respirar, anorexia, perda de peso e morte podem ocorrer. Ressalta-se que outras bactérias causam sinais parecidos, como é o caso do Staphylococcus spp., o Streptococcus spp. e a Bordetella spp.

 

 

O aparecimento de abcessos, que ocorre também em infecções por Staphylococcus spp., é outra forma comum da doença, sendo uma das principais causas de descarte de matrizes. Podem variar de tamanho, podendo ser volumosos e incômodos, porém nem sempre o coelho parece muito afetado. Podem estar na pele, na mucosa, região retrobulbar, nas genitálias, patas, ossos e órgãos internos. Um abcesso no ouvido médio pode levar à otite crônica e encefalite, com sinais clínicos como torcicolo, nistagmo e ataxia.

A forma séptica é causada por cepas mais patogênicas, levando à rápida morte do animal, muitas vezes sem sinais clínicos. Apresentam febre e apatia, com a morte ocorrendo de 24 a 48 horas após os primeiros sinais. As outras formas da doença também podem evoluir para a septicemia.

apresentada, outros agentes devem ser estudados, como Staphylococcus spp., Streptococcus spp., Bordetella spp., Klebsiella spp. e Pseudomonas spp. Sinais clínicos e exames complementares devem ser utilizados em conjunto para determinar a causa do surto. Outras doenças diferenciais para pasteurelose são: doença hemorrágica viral, encefalitozoonose, microsporiose e pneumocistose.

Os exames laboratoriais que podem ser utilizados para diagnosticar a pasteurelose são cultura, ELISA e PCR. No post-mortem, a necropsia e histopatologia contribuem para o diagnóstico.

O tratamento varia com a forma da doença apresentada. Locais como ouvido médio, abcessos e seios nasais não são bem alcançados pelo antibiótico, levando à recidiva da doença. A via mais apropriada para o tratamento é a parenteral, como injeções intramusculares ou subcutâneas. A confirmação do agente é importante para a escolha do protocolo de tratamento, incluindo o antibiótico e o tempo de tratamento, que varia, de um modo geral, de 1 a 3 meses.

O prognóstico da forma respiratória pode ser desfavorável em algumas cepas específicas, assim como quando mudanças ambientais não podem ser feitas. Aconselha-se o tratamento dos machos reprodutores como medida profilática. No caso de abcessos, aconselha-se o abate dos coelhos afetados, por razões sanitárias e econômicas. No caso de animais de alto valor econômico ou sentimental, como coelhos de estimação, o prognóstico varia caso a caso, sempre com tratamento em longo prazo.

Manter boas condições de higiene, manejo, ventilação e temperatura diminuem o risco de surtos. Quarentena de animais adquiridos em instalação separada do plantel é importante para evitar a possível entrada de novas cepas. A desinfecção das instalações com hipoclorito de sódio ou cloreto de benzalcônio é aconselhada.

Dependendo do tamanho do surto na propriedade, uma atitude mais drástica, a depopulação, pode ser a solução mais apropriada. Uma granja com abcessos e mastite nas matrizes associado aos abcessos subcutâneos em coelhos da engorda pode se encaixar nesse caso, pois o tratamento e controle da doença tornam-se financeiramente inviável. Nos casos onde seja inviável/desnecessário o abate do plantel, vários meses serão necessário para a estabilização da situação, de acordo com a forma da doença apresentada na granja. Por isso, a prevenção é essencial para evitar problemas com a pasteurelose (Figura 2).

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